EnTrA. eScUtA o BaNdOnEoN qUe ChOrA
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SeReNa

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Serena cheira sempre a rum queimado.


Quando dança e aquece, o perfume embebeda e das vezes que bailei com ela tive a estranha sensação que me quería dobrar, domar, nos volteios cheguei a sentir a banda a afastar-se dos acordes mas quando parámos, vi que era tudo coisa da minha imaginação.


Muito calor. E o cheiro queimado de Serena.


Habitualmente não danço com ela. Aflige-me a rudeza dela. É grosseira. Acho que Serena é bruxa, gosta de força, de violência, o tango à bruta, sinto-lhe as pernas a baterem no meu sexo e embora não me faça doer, parece que me magoa no pescoço, aqui na maçã de Adão.


Ela gosta dos gajos de navalha, dos gajos que lhe apertam a cintura e a batem contra o peito deles e depois no fim a largam no meio da milonga, desprezo, ela gosta disso.


Sou macho mas não se faz isso a quem faz os volteios como Serena. Deve ser por isso que cheira a queimado.

MuChA sUeRtE

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O soalho foi bem raspado, encerado, polido, ainda não está ferido de traços, curvas, meias luas cheias de um crepusculo que é a luz necessária. O resto alumia-se de cigarros enrolados entre dedos suados com cheiro de sexos excitados e os brilhantes dos vestidos justos das meninas.


Espero que Adelia venha.
Quando vem é bonito o salão, mais bonito. E se Margot também vier, Adelia ainda será mais bonita, a mais bela da milonga.
Margot é carrasco, o sapato com cunha para lhe dar o mesmo tamanho da outra perna atira para os braços dos homens borrachos uma cegueira de que só se arrependem no dia seguinte.


Está tudo muito bem.

O ar está fresco, as ventoinhas ouvem-se suave a bater o mel do tecto. Tarde, tarde nem farão esvoaçar os cabelos soltos das rabonas dos homens nem consolo ao calor entre pernas das meninas.


Talvez tenha sorte esta noite.
Talvez me chamem para acender um cigarro e Adelia tenha ciúmes.
Haverá tango.